Uma noite nas Urgências

Para quem procura um sítio original para passar o dia de S. Valentim, sugiro as urgências de um hospital público, de preferência, na qualidade de paciente. O sítio onde tudo acontece. Vá lá, não foi assim tão mau mas não é sitío que eu visitasse todos os dias.
Chegado às urgências, mandam-me para uma sala de triagem para avaliar a gravidade do meu estado. Depois de devidamente catalogado, tinha direito a uma etiqueta com uma cor, cada cor correspondente a um nível de urgência. Eu tive direito a uma etiqueta laranja, correspondente a "urgente". Por um lado é bom, despachava-me mais rapidamente, por outro lado, preocupava-me um bocadinho saber que o que eu tinha era "urgente". Não há-de ser nada. Eram só umas dorzinhas que quase me impediam de respirar. Se calhar por isso é que era urgente. Respirar costuma fazer jeito. Seja como for, lá me despacharam para um consultório de um médico. Confesso que ver aquela gente toda etiquetada me fez lembrar um matadouro. Mentalmente, fui construindo uma imagem onde os animais são catalogados conforme a qualidade da carne e, nesse sistema, uma etiqueta laranja só poderia querer dizer que era produto de qualidade, prioritário! Não seria um puro pata-negra (esses ficam para os fita vermelha) mas era digno de aparecer em qualquer montra na feira do fumeiro!!!
Continuando, depois de ser despachado do consultorio para os raios-X, entretive-me a ver o que dizia a minha etiqueta. Chamou-me a atenção o facto de eu ser um "episódio de urgência". Aqui achei claramente que alguém anda a ver Dr. House a mais. Querer fazer de cada paciente um "episódio" pareceu-me um bocado forçado. Ainda para mais, com o número de episódio que eu tinha (era um número de oito dígitos), aquilo já não era o Dr. House, era o Anjo Selvagem!
Já que falo em Dr. House, notei ainda outra grande falha nas Urgências. Não me refiro à falta de espaço, não me refiro à falta de pessoal, refiro-me à ausência das médicas e enfermeiras boas que se vê na televisão. Onde é que elas estavam? Fui atendido por um médico e um enfermeiro. E as gajas? Meteram folga esta noite? Não me digam que hospitais repletos de xixa de primeira só existem na TV... nem quero acreditar que o noso SNS está tão em baixo...
Já que se fala no pessoal, não posso deixar de me sentir animado quando pergunto ao enfermeiro que me está a tratar "afinal o que é que eu tenho?" e ele me responde com um encolher de ombros e diz "não sei... deve ser qualquer coisa muscular... penso que te deram analgésicos". Porreiro, pá! Porreiro! Siga adiante.
Há bocado falei na falta de espaço, a qual não seria de todo preocupante se apenas não houvesse onde meter macas, cozer a cabeça ao pessoal e coisas básicas do género. Agora, a coisa agrava-se muito mais quando me dizem que vou ter que levar uma injeção no rabo no meio de uma sala cheia de gente e virada para o corredor. Não é que eu tenha problemas em mostrar o meu real traseiro em público. Afinal, o que é bom é para se ver e eu não sou egoísta, por isso sempre que quiserem cá estarei para partilhar com o mundo os dotes que Deus me deu. Mas sinceramente pareceu-me que no estado em que algumas das pessoas à minha volta se encontravam, era capaz de não ser o espectáculo que mais lhes elevasse o espírito. Vá lá, no fim acabou por não ser nada e lá se arranjou uma maneira discreta de me injectarem, sabe-se lá o quê.
As coisas não melhoraram muito quando (finalmente) o médico que estava a acompanhar o meu "episódio" veio ter comigo para me dar alta e eu lhe repeti a pergunta que tinha feito ao enfermeiro, enquanto ele olhava para a minha radiografia. Novamente, resposta animadora: "aqui parece estar tudo bem, por isso deve ser uma cólica renal. Vais beber muita água e tomar isto, isto e isto". Ok. Da minha parte tudo bem. Mas não deixa de ser uma sensação gira quando ao fim de 2h30 de tratamentos o médico dá a sensação de saber tanto como quanto lá entrei e de ter atirado um diagnóstico a palpite. Mas isto sou eu, que nada sei dos meandros da saúde.
Fica a experiência. Recomendo vivamente a quem goste de experimentar coisas diferentes. Sugiro ainda, para dar um colorido diferente à coisa e experimentar uma perspectiva diferente, que apareça com a cabeça partida ou uma facano peito. Fica o conselho.

Comentários

Anónimo disse…
vaso ruim não quebra

;-)

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